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Os distúrbios do trato gastrointestinal, nomeadamente a obstipação, são muito comuns (Cullen, et al., 2007). Habitualmente denominada por “prisão de ventre”, a obstipação é a dificuldade na regular progressão das fezes ou na incapacidade máxima em evacuar, sendo classificada como um sintoma e não propriamente uma doença. Nesta condição, as fezes tendem a ficar mais duras e secas e o grau de obstipação varia de pessoa para pessoa, podendo ser de curta duração ou, num estado mais grave, crónica. É considerada uma queixa frequente, levando a um estado de mal-estar e desconforto, afetando a sua qualidade de vida, o que leva geralmente à procura de ajuda médica. Não existe um padrão de funcionamento intestinal análogo para toda a população, no entanto, na maioria dos indivíduos saudáveis a frequência das evacuações é inferior a três vezes por dia e superior a três vezes por semana (Garrigues, et al., 2014; Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia).

A maior parte dos casos é temporária e sem gravidade, em que uma alimentação pouco correta é apontada como a principal causa. As fezes são constituídas pela parte dos alimentos que não vai ser assimilada. São ainda, compostas na sua maioria por fibras, cuja capacidade de absorver a água presente no intestino, permite que estas sejam mais volumosas e, simultaneamente com consistência mais mole, facilitando a sua expulsão do organismo. O teor de água que constitui as fezes é determinado pelo tempo em que estas permanecem no interior do intestino. Assim, processos que atrasem o funcionamento intestinal, podem tornar as fezes com uma consistência mais dura e com menos volume, provocando a obstipação (Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia).

As principais causas indicadas são a administração de fármacos que abrandam o trânsito intestinal, a presença de desidratação, a ingestão escassa de fibra alimentar, patologias que afetam o trânsito intestinal ou um funcionamento lento do intestino, bem como o stresse, a idade ou a ansiedade (Shin, et al., 2015; Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia). Pode afetar a população em geral, sendo que as mulheres são mais afetadas que os homens.Para todas as pessoas, independentemente da idade, a terapia nutricional deve ser considerada como ação de primeira linha, antes de recorrer à terapêutica farmacológica (Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia;Bharucha, et al., 2013; Nutrition Guideline, 2015).

GRÁVIDAS

Durante a gravidez,a obstipação é um dos desconfortos mais frequentes que afeta cerca de 35-40% das mulheres grávidas, sendo mais ocorrente no último trimestre, como resultado das alterações fisiológicas naturais deste período (Direção Geral da Saúde, 2015;WHO, 2001; Guerra, et al., 2011). Situações de desidratação (vómitos ou fraca ingestão oral); alterações hormonais (como o aumento da hormona progesterona); diagnóstico de Síndrome do Intestino Irritável (SII)ou reduzida atividade física, podem ser apontadas como causas da obstipação. Pode ser originada na gravidez, todavia, a mulher grávida poderá ter iniciado os sintomas de obstipação antes de engravidar e terem agravado durante o período da gravidez(Cullen, et al., 2007;Position of the American Dietetic Association, 2008; Institute of Medicine, 1990; 16).

Em termos alimentares, de forma a aliviar o incomodo aconselha-se a grávida a aumentar a ingestão delíquidos, preferindo a água (cerca de 2L por dia); aumentar o consumo de alimentos ricos em fibra (pão integral, arroz integral, cereais integrais, hortícolas e frutas frescas e secas tais comofigos e ameixas) e manter ou iniciar, um estilo de vida ativo através da prática regular de atividade física (Direção Geral da Saúde, 2015; Cullen, et al., 2007). Importante salientar, que será necessário algum tempo para que estas medidas surtem efeito, mediante o funcionamento de cada organismo. A toma de suplementação de ferro, pode provocar ou agravar a sintomatologia, pelo que será necessário consultar o seu médico (WHO, 2001;Turawa, et al., 2015).

PÓS-PARTO

A obstipação é um problema muito comum também no período pós-parto, que afeta cerca de 1 em cada 4 mulheres. Nesta fase, pode ser causada pelos altos níveis de progesterona durante a gravidez, hemorroidas, dor no local da episiotomia e alterações ao nível do períneo. No entanto, distúrbios funcionais intestinais pré-existentes, especialmente a síndrome do intestino irritável (SII), bem como os efeitos colaterais dos medicamentos, redução da atividade física e alterações na ingestão alimentar (menor consumo de alimentos ricos em fibra), podem ser fatores de risco para o desencadeamento da sintomatologia (Nutrition Guideline, 2015). Numa fase de recuperação como o pós-parto, a dor sentida devido à obstipação não será apenas um desconforto para a mulher, como também poderá influenciar a saúde física e social, podendo dificultar consequentemente, a resposta materna às necessidades do bebé.

Ao nível da intervenção nutricional, é possível aliviar os sintomas através do aumentoda ingestão de líquidos (pelo menos 1,5 a 2L de água/dia) e de alimentos ricos em fibras (vegetais verdes e crus, fruta fresca com casca, cereais integrais) e a prática de atividade física regular (Direção Geral da Saúde, 2015; Turawa, et al., 2015).

CRIANÇAS

A obstipação é uma das doenças intestinais mais comuns que afeta a população infantil, em todo o mundo em que, cerca de 17 a 40% das crianças, são afetadas logo no primeiro ano de vida(Guimarães, et al.,2001; Tabbers, et al., 2014). De um modo geral, nesta faixa etária ocorre devido a erros alimentares. Alguns fatores que devem ter sido em consideração numa avaliação à criança para diagnóstico da obstipação, incluem: idade de inicio dos sintomas, sucesso ou insucesso nas idas à casa de banho, frequência e consistência das fezes dor e/ou sangramento ao passar pelas fezes, coexistência de dor abdominal ou incontinência fecal, se faz alimentação com leite materno, histórico alimentar (caso não se alimente exclusivamente com leite materno), alterações no apetite, náusea e/ou vómito e perdas de peso (Tabbers, et al., 2014). No recém-nascido não existe um número concreto de dejeções ou um horário dito “normal”. É importante saber que todos os bebés fazem força para defecar, mesmo que as fezes não sejam duras. Desta forma, é normal o recém-nascido ficar vermelho e por vezes chorar quando defeca.

Em bebés que sejam amamentados exclusivamente, mudanças na alimentação podem resultar em alterações na consistência das fezes e/ou mudança na frequência dos movimentos intestinais. Isso pode incluir: mudança do leite materno para leite em pó ou de vaca; introdução de novas fórmulas; introdução de alimentos complementares.Nesta condição, se tiver fezes secas e duras, a hidratação deve ser avaliada e direcionada para um médico (Nutrition Guideline, 2015).Em idade pediátrica, uma alimentação rica em fibras solúveis e a abundância de líquidos deve ser a primeira medida a implementar(Castillejo, et al., 2006; Jennings, et al., 2009; Speridião, et al., 2003).

Em conclusão: a alimentação é um fator essencial a ter em consideração na obstipação. Para a população em geral, as medidas alimentares e de higiene constituem, portanto, as primeiras pistas para o tratamento da obstipação: insistir em fazer refeições completas que inclua a ingestão diária de fibra alimentar e de líquidos adequados, acompanhada por uma atividade física suficiente. Indicamos alguns alimentos ricos em fibra:  Cereais (farelo, flocos, pão e bolachas integrais); Fruta fresca e seca (ameixa, figos, pêssego, citrinos, frutos tropicais); Vegetais (couve, feijão, grão, ervilha, fava, salada) e os Frutos secos (Direção Geral da Saúde, 2015; Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia).

Sugestão de Receita: Papas de aveia.

Ingredientes: 1 chávena de aveia em flocos + 2 chávenas de leite de vaca ou bebida vegetal (sabor a gosto) + 2 colheres de sopa de coco ralado + ½ chávena de manga cortada aos cubos + 2 colheres de sopa de frutos secos (amêndoas, cajus, nozes, avelãs).

Modo de Preparação: juntar os flocos de aveia e o leite numa panela em lume médio. Deixar ferver e ir mexendo até que a aveia comece a dissolver e o leite fique com uma consistência grossa. Continuar a mexer até que atinja a textura e consistência desejada. Quando estiver pronto, servir e adicionar a manga, o coco ralado e os frutos secos.

Para perceber qual a melhor alimentação a adequar, no seu caso, seja durante a gravidez, na recuperação de pós-parto ou com o seu bebé, agende uma consulta de Nutrição com a nossa Equipa de Nutrição e melhore a vossa qualidade de vida. A sua alimentação pode realmente ser a chave para aliviar e resolver esta sintomatologia!

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Bharucha AE, Dorn SD, Lembo A, & Pressman A (2013). American Gastroenterological Association Medical Position Statement on Constipation. Gastroenterology, 144(1), 211–217.doi:10.1053/j.gastro.2012.10.029. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23261064.

Castillejo G, Bulló M, Anguera A, Escribano J, Salas-Salvadó J (2006). A controlled, randomized, double-blind trial to evaluate the effect of a supplement of cocoa husk that is rich in dietary fiber on colonic transit in constipated pediatric patients. Pediatrics. 118:e641–e648. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16950955.

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Direção Geral da Saúde (2015). Alimentação e Nutrição na Gravidez. Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável. Lisboa. ISBN: 978-972-675-221-9. Disponível em: http://www.alimentacaosaudavel.dgs.pt/activeapp/wp-content/files_mf/1444899925Alimentacaoenutricaonagravidez.pdf.

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