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A gravidez e a fase do pós-parto são marcadas por profundas mudanças que interferem na vida da mulher. Com o ganho de peso adquirido naturalmente ao longo do período da gravidez, a maioria das recém-mamãs demonstra preocupação em recuperar o peso prévio à gravidez.

Para além do peso, durante a fase gestacional tende também a existir um maior ganho de tecido adiposo, sendo que estas reservas são geralmente utilizadas durante a produção de leite materno/amamentação, por serem processos que necessitam de muita energia, o que irá ajudar no processo de recuperação do peso (Baião &Deslandes, 2006; Mecacci, et al., 2015; WHO, 2001).

Os princípios de uma alimentação saudável recomendados para o período da gravidez, devem de igual modo, ser aplicados após o parto e durante a fase de amamentação, garantindo o aporte necessário e adequado de energia, vitaminas e minerais, importante para a produção e composição do leite materno, bem como para o normal desenvolvimento do bebé. Caso sejam praticados hábitos alimentares menos saudáveis, estas reservas essenciais para a mãe e para o bebé, poderão ser colocadas em risco (Mecacci, et al., 2015; WHO, 2001).

Energia: As mulheres que estão a fazer amamentação exclusiva até aos 6 meses, têm as suas necessidades energéticas aumentadas em 330 Kcal nos 6 primeiros meses e nos restantes 6 meses de lactação, aumentam 400 Kcal diárias. O gasto energético da amamentação exclusiva desde o primeiro dia de vida até aos 6 meses é de 500 kcal/dia. Esta estimativa é baseada no volume médio de leite que a mamã produz (780 ml/dia), bem como no teor energético médio do leite (67 kcal/100 ml) (Escott-Stump S, KathleenMahan L. Krause, 2008; Mecacci, et al., 2015; EFSA, 2013).

Em casos de obesidade ou sobrepeso, as mulheres poderão não precisar de aumentar as suas necessidades energéticas, devido às reservas de gordura materna acumuladas ao longo da gravidez fornecerem cerca de 100 a 150 Kcal, suportando os primeiros meses de lactação.

As mulheres saudáveis que amamentam geralmente tendem a perder o equivalente a 0,45 kg/semana, conseguindo produzir de igual forma, leite para manter o crescimento do seu bebé, sendo que esta perda moderada de peso, típica do período pós-parto, com ou sem exercícios, não afeta negativamente a lactação (Mecacci, et al., 2015).

Desta forma, durante o período de amamentação, aconselha-se as mulheres a evitarem restrições energéticas drásticas com o objetivo de perda de peso num curto espaço de tempo (Escott-Stump S, KathleenMahan L. Krause, 2008; FoodandNutritionBoard, Instituteof Medicine, 2002; Associação Portuguesa dos Nutricionistas, s.d.; Marangoni, et al., 2016).

Todas as mulheres são diferentes e as suas necessidades de energia vão sendo modificadas, ao longo da amamentação. Fatores como a idade, o tamanho, o apetite do bebé, bem como o seu próprio índice de massa corporal (IMC), a atividade diária e se está a amamentar em exclusivo ou não, ou se está a amamentar gémeos ou vários bebés, vão influenciar a quantidade de calorias necessárias para a mulher (Dewey KG, 1997).

Proteína: Normalmente não são necessárias suplementações ou consumo aumentado, uma vez que a mulher, por norma, já consome proteína de origem animal (carne, peixe e ovos), com alto valor biológico, em quantidades superiores ao desejado. Deve por isso guiar-se às recomendações e orientações da Roda dos Alimentos, referentes a este grupo de alimentos. As recomendações sugerem um consumo semelhante ao indicado durante a gravidez (Escott-Stump S, KathleenMahan L. Krause, 2008; Associação Portuguesa dos Nutricionistas, s.d.).

Hidratos de Carbono: A principal fonte de energia do organismo são os hidratos de carbono, por esta razão é de elevada importância o seu consumo durante a lactação. Sendo por isso importante, a ingestão diária e várias vezes ao dia, de alimentos ricos em hidratos de carbono, tais como o pão integral, a batata, a massa, o arroz, a aveia (grupo dos cereais derivados e tubérculos). As recomendações a nível de quantidade diária, diminuem da gravidez para o pós-parto (Escott-Stump S, KathleenMahan L. Krause, 2008; Associação Portuguesa dos Nutricionistas, s.d.).

Gorduras: O tipo e a quantidade de gordura ingerido vão refletir-se diretamente na composição do leite materno. Não existem recomendações específicas relativas à ingestão de gorduras para a mulher lactante, uma vez que depende da quantidade de energia que a mãe necessita para equilibrar a produção de leite (Escott-Stump S, KathleenMahan L. Krause, 2008; Associação Portuguesa dos Nutricionistas, s.d.).

O ómega-3 está igualmente recomendado na fase de lactação, pois o consumo de peixe e marisco, rico em ácidos gordos ómega 3,  apresentam benefícios no desenvolvimento cerebral do bebé. É importante dar preferência ao consumo de peixes com baixa concentração em mercúrio, pelo risco de ocorrerem alterações no sistema nervoso. Desta forma, salmão, atum, camarão, entre outros, são consideradas boas opções.

Vitaminas e Minerais: Nesta fase da vida da mulher, as necessidades de vitaminas A, C, E e do complexo B e minerais, tais como o iodo, o selénio e o zinco estão aumentadas (Escott-Stump S, KathleenMahan L. Krause, 2008; Associação Portuguesa dos Nutricionistas, s.d.).

A quantidade de vitamina D presente no leite materno está relacionada com a ingestão materna desta vitamina (exemplos: óleo de fígado de bacalhau, sardinha, salmão, atum, ovo) e com o grau de exposição solar. Apenas em caso de deficiência através da alimentação materna, poderá ser necessário recorrer a suplementação. Contrariamente, o conteúdo de cálcio do leite materno não está relacionado com o consumo materno. As recomendações mantêm-se as mesmas para as mulheres que estão a amamentar, para as mulheres grávidas, bem como para as não-grávidas (cerca de 1000mg). Exemplos: leite e derivados, espinafres, brócolos, linhaça, grão de bico.

Quanto às necessidades de zinco, durante a lactação, são superiores às necessidades durante a gravidez. As recomendações indicam cerca de 12 a 14 mg diárias (exemplos: Flocos de aveia, pinhão, queijo, castanha de caju). O conteúdo de iodo no leite materno, reflete o consumo por parte da mãe. As recomendações para mulheres durante a amamentação são superiores às mulheres durante a gestação, indicando um consumo diário de 290 mcg (exemplos: pescado, lacticínios e ovos).

A necessidade materna de ferro não é aumentada durante a lactação, pois devido à amenorreia pós-parto, a sua perda é menor (exemplos: gema de ovo, feijão, ervilhas, espinafres).

Cafeina: O consumo materno de cafeína existente em fontes como o café, o chá, o cacau, refrigerantes, bebidas energéticas e em alguns medicamentos, deve ser limitado a 200 mg/dia, ou seja, o equivalente a 1 ou 2 chávenas de café (WHO, 2001; DGS, 2015; EFSA, 2015). Quando ingerida, a quantidade de cafeína que surge na composição do leite materno, corresponde a cerca de 1% da ingestão materna e o nível de cafeína no leite materno, geralmente, atinge um pico cerca de 60 minutos depois de consumido (Berlin, et al., 1984).  Alguns recém-nascidos podem ser particularmente sensíveis à cafeína, devido ao facto do seu organismo, ainda bastante imaturo, demorar algum tempo a processar este composto orgânico (AustralianBreastfeedingAssociation , 2017), o que pode provocar episódios de hiperatividade e problemas no sono do bebé (WHO, 2001).

Álcool: Evidências indicam que a presença de pequenas quantidades de álcool no leite materno (por exemplo, a mãe bebeu 1 copo e amamentou mais tarde) pode interromper o padrão comportamental sono-vigília do seu bebé (Guelinckx, et al., 2011). Quanto à sua excreção, sai da circulação sanguínea tal como sai do leite materno. Não será através da ingestão de maior quantidade de água; descansar e dormir ou até mesmo, “bombeando” e “descartando” o leite, que aumentará a velocidade de excreção desta substância do seu organismo. Portanto, não beber álcool é a opção mais segura (La LecheLeague GB, 2017).

Em conclusão, no período em que a mãe ainda se está a habituar à rotina dos cuidados ao bebé, muitas vezes esquece-se de se alimentar equilibradamente. Praticar hábitos saudáveis durante o tempo de lactação, é essencial para uma boa saúde nutricional do bebé e da recém-mamã.

Relativamente aos alimentos que deve evitar ou que poderão provocar cólicas no bebé, apesar dos estudos que já existem, esta é uma temática bastante controversa (Hyman, et al.,2006). Ainda assim, a restrição alimentar parece ser uma atitude demasiado drástica a tomar, com o risco de prejudicar o aporte de nutrientes necessários à amamentação. O método ‘tentativa/erro’ poderá ser a melhor posição a adotar pela mamã, refletindo sobre a sua dieta, prestando atenção às reações do seu filho, procurando ingerir apenas pequenas porções dos alimentos que considerem suspeitos ao inseri-los em refeições mais distanciadas ao longo do tempo. Deste modo, estando a amamentar ou não, a mamã pode comer de tudo, desde que esteja consciente das suas necessidades nutricionais e estando atenta aos diversos sinais que possam surgir pelos seus bebés.

Reconhecendo que cada mulher tem as suas necessidades especificas e que cada caso é um caso, não podendo generalizar para todas as mulheres em fase no pós-parto, o ideal será mesmo procurar um médico ou nutricionista, os melhores profissionais para a acompanhar e individualizar as recomendações adaptadas a si e ao seu bebé.

 


 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 

Associação Portuguesa dos Nutricionistas (s.d.). Lactação. Disponível em: https://www.apn.org.pt/ver.php?cod=0E0C0J.

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Baião MR &Deslandes SF (2006). Feeding in pregnancy and postpartum. Revista de Nutrição. Campinas, Março/Abril. 19(2):245-253. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rn/v19n2/a11v19n2.pdf.

Berlin CM, Denson HM, Daniel CH, Ward RM (1984). Disposition of Dietary Caffeine in Milk, Saliva, and Plasma of Lactating Women. American Academy of Pediatrics. 73 (1): 59-63. Disponívelem: https://pediatrics.aappublications.org/content/73/1/59.

Dewey KG (1997). ENERGY AND PROTEIN REQUIREMENTS DURING LACTATION. Annual Review of Nutrition, 17(1), 19–36. doi:10.1146/annurev.nutr.17.1.19. Disponívelem: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9240917.

Direção Geral da Saúde (2015). Alimentação e Nutrição na Gravidez. Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável. Lisboa. ISBN: 978-972-675-221-9. Disponível: http://www.alimentacaosaudavel.dgs.pt/activeapp/wp-content/files_mf/1444899925Alimentacaoenutricaonagravidez.pdf.

EFSA Panel on Dietetic Products, Nutrition and Allergie (2013). Scientific Opinion on Dietary Reference Values for energy. EFSA Journal, 11(1), 3005. doi:10.2903/j.efsa.2013.3005. Disponível em: https://efsa.onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.2903/j.efsa.2013.3005.

EFSA Panel on Dietetic Products, Nutrition and Allergie (2015). Scientific Opinion on the safety of caffeine. EFSA Journal, 13(5). doi:10.2903/j.efsa.4102. Disponível em: https://efsa.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.2903/j.efsa.2015.4102.

Escott-Stump S, Kathleen Mahan L. Krause (2008). Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. Saunders Elsevier; 12ªedição.

Food and Nutrition Board, Institute of Medicine (2002). Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and aminoacids. Washington, DC. The National Academies Press. ISBN 0-309-08537-3. Disponívelem: https://www.nal.usda.gov/sites/default/files/fnic_uploads/energy_full_report.pdf.

Guelinckx I, Devlieger R &Vansant G (2011). Alcohol during pregnancy and lactation: recommendations versus real intake. Archives of Public Health, 68(4). doi:10.1186/0778-7367-68-4-134. Disponívelem: https://archpublichealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/0778-7367-68-4-134.

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Mecacci F, Biagioni S, Ottanelli S, Mello G (2015). Nutrition in pregnancy and lactation: how a healthy infant is born. Journal of Pediatric and Neonatal Individualized Medicine. 4(2):e040236. doi: 10.7363/040236. Disponívelem: http://www.jpnim.com/index.php/jpnim/article/viewFile/040236/284.

World Health Organization (2001). Healthy eating during pregnancy and breastfeeding. Booklet for mothers. Disponívelem: http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0020/120296/E73182.pdf.

Nutricionista Estagiária

Flávia Neca